Que o Brasil passa por uma
recessão econômica, ninguém pode negar, e tampouco há otimismo em relação à
recuperação da economia, pelo menos não no próximo ano. No entanto, é
importante ressaltar algumas medidas que têm sido propostas pelo novo governo e
sua equipe econômica.
A primeira grande medida, e já
aprovada pela Câmara e pelo Senado, é a PEC dos gastos públicos, que limita a
despesa primária do governo ao gasto do ano anterior reajustado pela inflação, para
os próximos vinte anos. Essa medida gerou grande debate entre economistas,
políticos e sociedade civil em geral, visto que o orçamento a partir de agora
será muito mais limitado e a briga por recursos será mais acirrada. Muitos
acreditam que as políticas sociais, tão necessárias em um país de enorme
desigualdade como o Brasil, sairão prejudicadas, e por isso a medida de ajuste
fiscal poderia ter sido mais branda e melhor debatida com a sociedade; por outro
lado, há aqueles que argumentam que, embora o teor do ajuste poderia ter sido
melhor debatido, o ajuste é necessário independente do formato, e vai gerar um
efeito positivo sobre o debate do orçamento público, priorização de recursos e
eficiência das políticas públicas como um todo. Enfim, o argumento central da
medida é que o ajuste fiscal tem o objetivo de aumentar o superávit primário,
gerar maior poupança para o governo e assim margem para redução da taxa básica
de juro, fator necessário para a recuperação da economia.
Outra medida polêmica colocada em
debate pelo atual governo é a reforma da previdência. A reforma é essencial
tanto para o ajuste fiscal quanto para a sustentabilidade do sistema
previdenciário do Brasil. São muitas
questões a serem discutidas no âmbito da reforma, desde privilégios de classe,
tempo e valores para contribuição, até a gestão eficiente desses recursos. O
que me parece óbvio é que não dá mais para adiar a reforma: quanto mais tempo
para aprová-la, maior vai ser o custo para a sociedade.
Também essencial para o ajuste
fiscal proposto pelo governo federal é o ajuste dos demais entes federativos:
estados e municípios. A dívida dos estados com a união afeta diretamente os
orçamentos estaduais. Diante disso, o Governo Federal propôs renegociar a
dívida se os estados cumprirem algumas condições que visem à recuperação
fiscal. Aparentemente a negociação não será fácil. A proposta do governo
encaminhada à Câmara Federal sofreu diversos ajustes no sentido de retirar algumas
das condicionantes para os estados. No entanto, o Governo Federal, por meio do próprio
presidente, reiterou que não vai negociar se não houver plano de ajuste fiscal
consistente como contrapartida.
Outras medidas de cunho mais
microeconômico também foram colocadas na mesa. Começando pela reforma da
legislação trabalhista, há um texto propondo que empresa e trabalhador podem
negociar diretamente alguns termos dentro da legislação. Dentre elas destaca-se
a jornada diária de trabalho, em que o regime de horas trabalhadas pode ser
adequado, por meio de acordo entre patrão e trabalhador, ao tipo de atividade
econômica realizada. Isso quer dizer que empresa e trabalhador podem negociar
dias e horas trabalhadas de acordo com o ritmo e sazonalidade da atividade, mas
sempre respeitando o número de horas a serem cumpridas no mês conforme a
legislação. Outra medida ainda no âmbito das reformas da lei trabalhista é
referente às férias, que dá maior flexibilidade ao empregador e ao colaborador
para negociação do benefício.
A liberação para sacar parte do
Fundo de Garantia de Tempo de Serviço (FGTS) foi outra medida que agradou a
maioria dos analistas. Essa medida autoriza os trabalhadores a sacar parte do
FGTS para ser utilizada da forma que o trabalhador julgar conveniente, seja
para pagar dívidas, seja para consumo. Do meu ponto de vista, uma medida
positiva que dá mais autonomia às pessoas para gerir um dinheiro que é seu e
que está aplicado em um fundo que decresce ao longo do tempo, uma vez que o
atual rendimento do FGTS é inferior à inflação.
Mais duas medidas que gostaria de
destacar, ainda no âmbito microeconômico, foi a proposta de renegociação dos
impostos atrasados devidos pelas empresas, que tira a corda do pescoço do setor
privado dando maior margem financeira para as empresas tocarem seus negócios; e
a redução no prazo para que as empresas de cartão de crédito repassem o valor
das compras feitas para os lojistas. O efeito desta medida teria um impacto
imediato para os bancos, que receberiam os valores mais rápido, e logo vai
abrir espaço para reduzir o juro cobrado dos empresários (que são repassados
aos consumidores) gerando um efeito positivo sobre o consumo.
Parece que a equipe econômica tem trabalhado em diversas frentes, tanto macroeconômica quanto microeconômica, na tentativa de recuperar a economia brasileira. De acordo com o ministro da fazenda, Henrique Meirelles, há uma agenda rigorosa a ser cumprida nos próximos meses de governo. Sabemos que nada acontece do dia para a noite e tampouco as medidas estão isentas a críticas e falhas de execução. Além disso, existem outras variáveis para além das medidas econômicas que devem ser observadas. O Brasil é complexo e é preciso estar atento às mudanças que, neste momento, estão acontecendo de forma muito rápida.
*Marcelo Borges é formado em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Minas Gerais e mestre em Economia pela Universidade Federal de Pernambuco.